Nota à Imprensa da Presidência da República
Palácio de Belém 30 de Novembro de 2004
1. O Presidente da República encontrou-se hoje com o Senhor Primeiro Ministro, para continuação da apreciação dos desenvolvimentos políticos recentes.
2. O Presidente da República, ponderada a situação política actual, comunicou ao Senhor Primeiro Ministro a sua decisão de ouvir os partidos políticos com representação parlamentar e o Conselho de Estado, nos termos do art. 133º, alínea e) da Constituição da República.
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Por PAULO SANDE, Director do Gabinete do Parlamento Europeu em Lisboa
"Concorda com a Carta dos Direitos Fundamentais, a regra das votações por maioria qualificada e o novo quadro institucional da União Europeia, nos termos constantes da Constituição para a Europa?"
O principal problema da pergunta para o referendo sobre o Tratado Constitucional não é a sua eventual falta de clareza. O principal problema é que ela está formalmente errada.
O erro consiste no seguinte:
Na parte da pergunta "Concorda... a regra das votações por maioria qualificada e o novo quadro institucional da União Europeia...", usa-se a letra E como conjunção coordenativa aditiva. Neste contexto gramatical ela significa simplesmente "mais". Isto é: "Concorda com... a regra das votações por maioria qualificada mais o novo quadro institucional da União Europeia...?".
São por isso duas questões separadas, como se se perguntasse: "Concorda com a regra das votações por maioria qualificada? E concorda com o novo quadro institucional da União Europeia?".
Ora a regra das votações por maioria qualificada faz parte integrante do novo quadro institucional. O título IV do capítulo I do Tratado Constitucional é, exactamente, "Quadro Institucional". Nele se integra, no artº 25, a definição da maioria qualificada. A pergunta correcta devia ser: "Concorda com... o novo quadro institucional, nomeadamente com a regra das votações por maioria qualificada?"
Terão os perguntantes querido perguntar outra coisa? Corre por aí, mesmo em fontes bem informadas, que a pergunta "Concorda... com a regra das votações por maioria qualificada..." implica todo o processo de decisão, incluindo o alargamento das matérias a que essa maioria se aplica. É tomar a parte pelo todo, erro bem conhecido da ciência jurídica. E resultaria no absurdo de a pergunta incluir tudo o que não está lá - processo de co-decisão, nova tipologia dos actos jurídicos da União, extensão das matérias - excluindo, por força dos termos da pergunta, exactamente aquilo que lá expressamente se pergunta (artº 25 - a forma como se constitui a maioria qualificada e as minorias de bloqueio). Mas se fosse isso que se pretendia então a pergunta devia ser "Concorda com... as novas regras do processo de decisão e com o novo quadro institucional?". Não foi isso que foi perguntado.
Imagine-se aliás que se quer responder sim à "regra da... maioria qualificada" e não ao "quadro institucional". Como é possível, se uma faz parte do outro?!! E qual pesa mais: sim mais não faz o quê? Nim...?.
Dizem alguns que não tem grande importância. Cito Vital Moreira, de um artigo, aliás admirável, sobre a 'Europa social': "Por mais questionável que seja a pergunta concreta, que sempre dirá pouco ao cidadão comum, toda a gente sabe que o que está em causa politicamente é saber quem é a favor ou contra a Constituição Europeia". Quer dizer, a pergunta é indiferente, porque o que se vai debater é todo o Tratado. Mas então bastaria perguntar "Prefere amargo ou doce?", sendo o doce ou amargo a Constituição. O problema não é a pergunta ser questionável, o problema é a pergunta estar errada.
Entende-se a boa vontade dos perguntantes. Tratou-se de obviar às objecções pretéritas do Tribunal Constitucional a propósito da falta de objectividade, precisão e clareza da pergunta de 1998 sobre o Tratado de Amesterdão. Por isso, e na linha do permitido pela Constituição Portuguesa, escolheram-se as questões concretas julgadas mais relevantes e cozinhou-se uma pergunta passível de ser aceite pelo Tribunal.
Não se trata aqui da escolha das questões. A Carta dos Direitos Fundamentais passa a ter carácter vinculativo e é relevante para os cidadãos; o processo de decisão no sentido lato (se tivesse sido essa a pergunta) sofre mudanças substanciais; o quadro institucional inclui novas figuras como o Presidente do Conselho Europeu e o Ministro dos Negócios Estrangeiros, o sistema de Presidência das formações do Conselho, a composição da Comissão ou o processo de eleição do seu Presidente pelo Parlamento Europeu. Claro que ficam de fora outras questões relevantes, que o debate não pode esquecer, qualquer que seja a pergunta. É por exemplo o caso do primado das leis europeias, que merece explicação; das novas regras da aplicação da subsidiariedade às competências partilhadas, com a participação dos parlamentos nacionais; do papel da Agência Europeia de Defesa; do dever de auxílio e assistência a um Estado-membro em caso de agressão armada no seu território.
Mas se isso é indiscutível, não podemos adoptar a posição da avestruz e ignorar o erro que a pergunta contém. Estranha é tanta polémica, que uma revisão constitucional teria evitado.
"Concorda com o Tratado Constitucional que estabelece uma Constituição para a Europa?" é sem dúvida a pergunta certa, se se considera adequado referendar o Tratado em Portugal. Com 50 por cento e mais um dos eleitores a ir às urnas, a resposta será vinculativa para a Assembleia da República.
Como está, a pergunta está errada.
O principal problema da pergunta para o referendo sobre o Tratado Constitucional não é a sua eventual falta de clareza. O principal problema é que ela está formalmente errada.
O erro consiste no seguinte:
Na parte da pergunta "Concorda... a regra das votações por maioria qualificada e o novo quadro institucional da União Europeia...", usa-se a letra E como conjunção coordenativa aditiva. Neste contexto gramatical ela significa simplesmente "mais". Isto é: "Concorda com... a regra das votações por maioria qualificada mais o novo quadro institucional da União Europeia...?".
São por isso duas questões separadas, como se se perguntasse: "Concorda com a regra das votações por maioria qualificada? E concorda com o novo quadro institucional da União Europeia?".
Ora a regra das votações por maioria qualificada faz parte integrante do novo quadro institucional. O título IV do capítulo I do Tratado Constitucional é, exactamente, "Quadro Institucional". Nele se integra, no artº 25, a definição da maioria qualificada. A pergunta correcta devia ser: "Concorda com... o novo quadro institucional, nomeadamente com a regra das votações por maioria qualificada?"
Terão os perguntantes querido perguntar outra coisa? Corre por aí, mesmo em fontes bem informadas, que a pergunta "Concorda... com a regra das votações por maioria qualificada..." implica todo o processo de decisão, incluindo o alargamento das matérias a que essa maioria se aplica. É tomar a parte pelo todo, erro bem conhecido da ciência jurídica. E resultaria no absurdo de a pergunta incluir tudo o que não está lá - processo de co-decisão, nova tipologia dos actos jurídicos da União, extensão das matérias - excluindo, por força dos termos da pergunta, exactamente aquilo que lá expressamente se pergunta (artº 25 - a forma como se constitui a maioria qualificada e as minorias de bloqueio). Mas se fosse isso que se pretendia então a pergunta devia ser "Concorda com... as novas regras do processo de decisão e com o novo quadro institucional?". Não foi isso que foi perguntado.
Imagine-se aliás que se quer responder sim à "regra da... maioria qualificada" e não ao "quadro institucional". Como é possível, se uma faz parte do outro?!! E qual pesa mais: sim mais não faz o quê? Nim...?.
Dizem alguns que não tem grande importância. Cito Vital Moreira, de um artigo, aliás admirável, sobre a 'Europa social': "Por mais questionável que seja a pergunta concreta, que sempre dirá pouco ao cidadão comum, toda a gente sabe que o que está em causa politicamente é saber quem é a favor ou contra a Constituição Europeia". Quer dizer, a pergunta é indiferente, porque o que se vai debater é todo o Tratado. Mas então bastaria perguntar "Prefere amargo ou doce?", sendo o doce ou amargo a Constituição. O problema não é a pergunta ser questionável, o problema é a pergunta estar errada.
Entende-se a boa vontade dos perguntantes. Tratou-se de obviar às objecções pretéritas do Tribunal Constitucional a propósito da falta de objectividade, precisão e clareza da pergunta de 1998 sobre o Tratado de Amesterdão. Por isso, e na linha do permitido pela Constituição Portuguesa, escolheram-se as questões concretas julgadas mais relevantes e cozinhou-se uma pergunta passível de ser aceite pelo Tribunal.
Não se trata aqui da escolha das questões. A Carta dos Direitos Fundamentais passa a ter carácter vinculativo e é relevante para os cidadãos; o processo de decisão no sentido lato (se tivesse sido essa a pergunta) sofre mudanças substanciais; o quadro institucional inclui novas figuras como o Presidente do Conselho Europeu e o Ministro dos Negócios Estrangeiros, o sistema de Presidência das formações do Conselho, a composição da Comissão ou o processo de eleição do seu Presidente pelo Parlamento Europeu. Claro que ficam de fora outras questões relevantes, que o debate não pode esquecer, qualquer que seja a pergunta. É por exemplo o caso do primado das leis europeias, que merece explicação; das novas regras da aplicação da subsidiariedade às competências partilhadas, com a participação dos parlamentos nacionais; do papel da Agência Europeia de Defesa; do dever de auxílio e assistência a um Estado-membro em caso de agressão armada no seu território.
Mas se isso é indiscutível, não podemos adoptar a posição da avestruz e ignorar o erro que a pergunta contém. Estranha é tanta polémica, que uma revisão constitucional teria evitado.
"Concorda com o Tratado Constitucional que estabelece uma Constituição para a Europa?" é sem dúvida a pergunta certa, se se considera adequado referendar o Tratado em Portugal. Com 50 por cento e mais um dos eleitores a ir às urnas, a resposta será vinculativa para a Assembleia da República.
Como está, a pergunta está errada.
In Público (edição impressa)
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A Direito... volver
O próximo bastonário vai enfrentar uma batalha dura para travar a massificação da profissão e o excesso de licenciados em Direito.
O próximo bastonário vai enfrentar uma batalha dura para travar a massificação da profissão e o excesso de licenciados em Direito.
Anualmente saem das faculdades entre 2500 a 3000 licenciados. A maior parte dos jovens advogados abandona a profissão nos três primeiros anos de carreira por dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Quem o diz é Fernando Sousa Magalhães, presidente da Comissão Nacional para a Formação da Ordem dos Advogados.
Este é um problema para o qual o actual bastonário dos Advogados, José Miguel Júdice, tem tentado encontrar solução e que constituirá um dos grandes cavalos de batalha para o seu sucessor. De resto, os três candidatos à liderança da Ordem têm-se mostrado sensíveis para as questões da massificação da advocacia e do elevado número de licenciados em Direito que todos os anos sai das faculdades. Neste ponto, pelos menos, os candidatos a bastonário são unânimes: só os melhores devem aceder à profissão.
Nos primeiros anos, porém, a sobrevivência dos jovens advogados está ligada à autonomia financeira e aos seus conhecimentos, dependendo desdes factores a conquista do mercado de trabalho. Afinal, um mercado já saturado com os actuais 23 mil advogados é incapaz de absorver os cerca de 2500 a 3000 licenciados que anualmente saem das faculdades.
A grande maioria, diz Fernando Sousa Magalhães, inscreve-se na Ordem, mas nem todos terminam o respectivo estágio. “Alguns ficam por vocação, outros vão derivando para outras profissões”. Mesmo assim, obtêm o título de advogado entre 1800 a 2000 estagiários por ano.
A licenciatura em Direito é de cinco anos e pode ser obtida em 17 faculdades, quer do ensino público, quer no sector privado – Universidade do Minho, Universidade de Coimbra, Clássica de Lisboa e do Porto, Nova de Lisboa, Católica de Lisboa e do Porto, Independente, Internacional, Luís de Camões, Lusíada de Lisboa e do Porto, Lusófona, Moderna de Lisboa e do Porto e Portucalense. Há ainda um pólo na Figueira da Foz.Findo o curso, o licenciado deve inscrever-se na Ordem para iniciar o estágio, que dura 18 meses. A inscrição custa 700 euros e pode ser paga de forma faseada. O estágio não é remunerado.
A primeira fase é de apenas três meses. O jovem licenciado deve frequentar um curso de formação ministrado pelos sete centros distritais da Ordem. A frequência é facultativa, mas o exame final obrigatório. Tem de obter classificação positiva nas três áreas curriculares (deontologia profissional, práticas processuais cíveis e práticas processuais penais).
Patronos procuram-se
Na segunda fase de estágio, alguém tem de abrir as portas do escritório para receber o jovem licenciado. Regra geral é o estagiário que escolhe o patrono, mas a Ordem também pode nomeá-lo. Estes 15 meses podem ser acompanhados pelos patronos-formadores da Ordem, subsidiados pelo Estado para orientar os estágios. Mesmo assim a Ordem gasta cerca de 1500 euros por cada estagiário. Quanto a saídas profissionais, o leque é vasto. Além da advocacia, o licenciado pode optar pelas Magistraturas, pelos registos, solicitadoria, diplomacia ou consultadoria. No mundo empresarial, as oportunidades são maiores. As eleições para bastonário realizam-se sexta-feira.
40.000 no desemprego
Portugal tem cerca de 40 mil licenciados no desemprego, a maior parte dos quais são mulheres. Uma questão para a qual a ministra da tutela já disse estar sensível. De acordo com Maria da Graça Carvalho, em 2005 o Governo vai disponibilizar 18 milhões de euros para investimentos, sobretudo em equipamentos, nas áreas da Enfermagem, Medicina e Tecnologias da Saúde. Trata-se de um plano que visa reconverter a formação inicial dos licenciados desempregados. Recorrendo a um sistema de créditos, já existente, e a novos cursos de especialização com equivalência a mestrado, vão ser criadas saídas profissionais para todos os que desejem reorientar a sua formação. (...)
Extraído de Correio da Manhã (edição impressa)
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Dossier Justiça d'«A Capital»:
O CENTRO DE ESTUDOS JUDICIÁRIOS
Para se ser magistrado em Portugal, tem de se passar obrigatoria e inevitavelmente pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ), visto ser a única escola do país, na área da magistratura. Em 22 meses, o CEJ transforma licenciados na área do Direito em juízes ou procuradores. Um processo de formação classificado de «bom» pelo Conselho Superior de Magistratura (CSM), mas considerado de pouco humano e realista por João Bilhim, professor catedrático do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP). O consenso verifica-se,porém, no recrutamento de candidatos a magistrados. Os dois anos de espera exigidos, entre a licenciatura e a admissão ao CEJ, não fazem sentido, pois não trazem qualquer mais valia aos candidatos. Num país como Portugal, onde o CEJ domina a formação de magistrados, não fará sentido a criação de outra instituição semelhante. Ao que parece, o fundamental passa por investir, melhorar e apostar na escola que existe. Uma licenciatura em Direito é o primeiro passo a dar por todos os que auguram uma carreira na magistratura. Só assim poderão realizar o exame de admissão. Contudo, um aspecto há que divide opiniões e causa alguma discórdia e polémica. Após a licenciatura, os interessados só se poderão candidatar ao CEJ passados dois anos da sua graduação. O motivo apresentado para este período de tempo prende-se com a maturidade dos candidatos. Paulo Guerra, juiz-secretário do CSM e antigo juiz-formador do CEJ, refuta esta teoria: «Há muitas pessoas que terminam o curso com 40 anos – os trabalhadores-estudantes, por exemplo. E, aos 42 anos, não terão uma maturidade maior.» De resto, esta exigência temporal poderá «afastar as pessoas da sua vontade de ingressar na magistratura, uma vez que, nesse tempo, podem encontrar outras ocupações». Na verdade, durante esses dois anos, os candidatos não são obrigados a exercer qualquer tipo de actividade, ou a completar qualquer tipo de formação. Mas certo é, também, que, a maioria dos licenciados em Direito, assim que termina o curso, aposta na admissão à Ordem dos Advogados. Admissão essa que implica um grande investimento de capital e de tempo, pelo que pode afastá-los definitivamente da carreira de magistrado. João Bilhim, relativamente ao recrutamento de magistrados, é directo: «É outra parvoíce!» O professor recorda que, «antes do 25 de Abril, ninguém era juiz sem passar por procurador. Agora estão os dois em pé de igualdade, só indo para procurador aqueles que não conseguem notas para ir para juiz».
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ENTRE A DIGNIDADE E A DÚVIDA (OU PORQUE NÃO SOMOS A SUÉCIA)
O juiz sueco apresentou-se no congresso sem gravata e de mochila às costas, para espanto dos restantes oradores. Na mochila, veio a perceber-se depois, tinha o seu portátil e conseguiu assim ser o primeiro dos poucos que entregaram a sua intervenção por escrito à organização, em Word...
Tome-se de empréstimo a Suécia por uns momentos. Na Suécia, país com quase a mesma população que Portugal e uma área consideravelmente superior, existem apenas 68 tribunais de primeira instância. Na Suécia, o seu equivalente ao nosso Supremo Tribunal de Justiça tem 16 juízes. Por comparação, em Portugal, o Supremo Tribunal de Justiça tem 61 juízes. Para que servem estes dados? Para nada, dirão muitos. Para dizer o que já se sabe, dirão outros: que a Suécia, afinal de contas, não é Portugal... Eu atrever-me-ia a sugerir uma outra utilização. Em vez de se utilizarem as experiências estrangeiras para importar acriticamente um qualquer modelo ou, inversamente, para ilustrar apenas a lamúria solene do nosso atraso estrutural, se o sucesso dos outros pudesse servir-nos para formular as perguntas certas, talvez se conseguisse qualquer coisa de bom. E isto pode ser aplicado aos nossos tribunais e aos nossos juízes. Voltando à Suécia. Há uns anos atrás, num congresso organizado em Lisboa, foi convidado um juiz sueco como orador, para falar da muito bem sucedida experiência sueca num determinado ramo do direito. Era um juiz de um tribunal superior, equivalente ao nosso Tribunal da Relação, com algumas décadas de trabalho em tribunais. Naturalmente, tratava-se de um congresso com a elite palestrante das magistraturas nacionais, sempre prontas para um suposto fausto de croquete e oração de sapiência. O juiz sueco estranhou quase tudo - desde a maçada que foram as intervenções às dúvidas metafísicas que se conseguiam levantar em Portugal em torno de coisas tão simples como quem é o dono de uma casa ou de um carro.
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O TEMPO DOS TRIBUNAIS INTERNACIONAIS
O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) É provavelmente o tribunal internacional mais conhecido dos portugueses, em especial daqueles mais atentos aos noticiários das televisões e às páginas dos jornais, onde com frequência se vê alguém a ameaçar o Estado com "uma queixa no tribunal europeu" ou com uma "queixa em Bruxelas". Estas expressões, apesar de correntes, são perigosas, porque não nos conduzem irremediavelmente ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) - por um lado, não é o único "tribunal europeu"; por outro lado, este tribunal não se situa em Bruxelas, mas sim no Luxemburgo... O TJCE é a principal instituição judicial da União Europeia e, durante longos anos, a única. Devido ao aumento exponencial das solicitações deste tribunal, foi recentemente criado um Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias, que acaba por fazer uma primeira triagem dos casos que são apresentados à instância da União. Este tribunal da União Europeia pode fazer sentar no banco dos réus quer os Estados-membros, quer as próprias instituições da União, como a Comissão Europeia, o Conselho da União ou o Parlamento Europeu, entre outras. A principal tarefa do TJCE é zelar pelo respeito do direito comunitário - ou melhor dizendo hoje, adaptando o vocabulário às mudanças institucionais, do direito da União, em especial do constante do Tratado da União Europeia. Ou seja, saber se um Estado está a cumprir, no plano interno, aquilo a que se comprometeu em conjunto com os restantes membros da União. Assim, se Portugal se atrasar na transposição para o direito interno de uma directiva comunitária ou se a administração portuguesa fizer uma interpretação errada de uma determinada regra de direito comunitário, isso pode levar à abertura de um processo contra o Estado português por incumprimento. A "queixa" ao tribunal é normalmente apresentada pela Comissão Europeia, designada também graças a essa competência como a "guardiã dos tratados". E muitas vezes a Comissão apercebe-se do erro dos Estados através de uma reclamação de um particular ou de uma empresa, que não têm legitimidade para recorrer directamente ao TJCE. Existe mesmo um formulário padrão, no sítio da Comissão Europeia na Internet, que qualquer cidadão pode preencher e enviar. Mas é claro que nem todas estas queixas acabam por terminar no tribunal, estando sujeitas antes às averiguações da Comissão Europeia.
Extraído de «A Capital»