sexta-feira, abril 28, 2006

Não destruam o Poder Judicial

«(...) Uma nota final (...). Refiro-me à campanha intensíssima que desde há uns tempos tem vindo a ser feita contra os tribunais, imputando-lhe toda a espécie de mazelas e responsabilizando-os pelos males do país. O poder judicial é exercido por pessoas da sociedade donde emanam. Não são portanto perfeitos. E todos sabemos que nem tudo funciona bem, sobretudo na demora dos processos e outras questões que excessivas exigências processuais são susceptíveis de provocar descontentamento na opinião pública.
Mas não se parta dessas eventuais deficiências para o ataque feroz que tem vindo a ser feito à nossa magistratura e a todo o poder judicial em si, que considero ser dos pilares mais sérios, mais seguros, mais sólidos da sociedade portuguesa. Em termos de justiça material, em termos de defesa dos direitos dos cidadãos, em termos de defesa da própria sociedade, em termos de seriedade dos próprios agentes, das próprias pessoas, que outro sector, actividade ou profissão lhe leva a melhor?
Quem tem as grandes fortunas feitas à pressa em Portugal? São os magistrados? Quem anda para aí de ostentação em ostentação, são os magistrados? Quem aparece por aí envolvido nos interesses confinantes com o dinheiro fácil, são os magistrados? Trabalham pouco, é isso? Têm mais férias que os outros, é isso? E então não vem ninguém dizer que tudo isso é uma mentira e uma farsa porque são exactamente eles das classes que mais trabalham, que levam para casa processos e mais processos em cujo estudo esgotam grande parte dos serões, enquanto que outros, bem estimados e melhor parecidos, passam esses mesmos serões em casas de alterne no norte do país ou nas bancas do Casino, desgraçando centenas de famílias que, aqui mesmo em Coimbra, sofrem em silêncio a amargura de uma vida destruída por esses cultores da vida fácil?
Farão as pessoas a mínima ideia do trabalho que dará a um magistrado, em termos de estudo, de análise, de ponderação, de reflexão, de apelo aos mais profundos sentimentos de Justiça, de respeito pelas exigências processuais, um processo que, por pequeno que seja, mexe sempre com os sentimentos mais profundos das partes envolvidas?
E naqueles processos onde estão em causa valores essenciais da vida?
Pensará alguém que mandar para a cadeia uma qualquer pessoa 10 ou 11 anos é tarefa fácil? Será fácil naquele emaranhado todo do diz um diz outro encontrar o fiel da balança que lhes indique a decisão justa?
Eu sei. Todos o pressentimos. A uma classe política destas, dominada por grupos da quinta linha, uma classe política destas à solta pelo afastamento dos melhores, alguns destes dando o seu melhor nas autarquias deste país, em verdadeiro espírito de missão, a uma classe política destas, dizia, não interessa um poder judicial forte, prestigiado e independente. Querem gente submissa. A quem se possa encomendar as decisões. Recomendar fechar os olhos. Andar depressa neste caso e devagarinho naquele. É assim que muita gente gostaria que fosse. Mas por enquanto ainda não é. E duvido que os seus detractores venham a ter êxito, sem com isto por em causa a seriedade de muitas críticas e de muito boa gente que as faz.
Mas à boleia disso há muita outra coisa. Todos o sabemos. Claro. A Maria José Morgado, que quando na Judiciária mexeu em tanta porcaria, é uma tola desbocada. Afasta-se e desacredita-se. É uma ex-MRPP que nunca arrepiou caminho. Pudera. Já viram até onde ela poderia ir? Então, para evitar histórias arruma-se. Encosta-se e faz uns despachos em processos inócuos.
O Santos Cabral? Um dos mais novos conselheiros de sempre em Portugal? Um dos mais prestigiados magistrados do país? Claro. Não tinha nada que falar. E se não tinha dinheiro para caçar com cão que caçasse com gato. Mas mesmo com gato viram que foi sob a sua direcção que melhor trabalho se fez na Judiciária nos últimos anos? Mas viram também que mal ele virou costas, apareceu logo dinheiro? Claro. Estes Santos Cabrais não interessam nada à essa oligarquia política que tem vindo a destruir este país, subjugando-se aos grandes interesses financeiros, onde só estorvam uma Polícia Judiciária activa e um poder judicial forte».
LINO VINHAL, IN CAMPEÃO DAS PROVÍNCIAS

O STJ como notícia

«Estranhamente a comunicação social não esteve ontem presente na tomada de posse de António Henriques Gaspar como vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Digo estranhamente por várias razões: porque a tomada de posse de um vice-presidente do mais alto tribunal do País é uma cerimónia suficientemente importante do ponto de vista político-institucional para merecer notícia; porque ainda há pouco outra tomada de posse na área da justiça (direcção da PJ) recebera ampla cobertura mediática; finalmente porque o STJ ainda há poucos dias fora notícia a propósito de uma sua decisão, parecendo isso revelar uma especial atenção à actividade deste tribunal.
Afinal não é nada disso.
O STJ só é notícia se cheirar a escândalo. É esse o "critério jornalístico" de cobertura noticiosa do tribunal. Mas é pena que seja assim. Ontem muito teriam a aprender os jornalistas que ali se tivessem deslocado com a audição do discurso do novo vice-presidente. E muita matéria teriam a reportar à opinião pública sobre a justiça vista duma perspectiva diversa da do "discurso da crise", que é o discurso dos que querem manter a crise a todo o custo e dessa forma apostam na deslegitimação do poder judicial, o discurso continuamente difundido e amplificado pela generalidade da comunicação social.
Para os que pretendem reflectir sobre a crise não há "tempo de antena"».
Cons. Eduardo Maia Costa, in Sine Die

Coragem

«O país está como está não por qualquer fatalidade ou exigência dos deuses.
Portugal está assim em grande parte por culpa própria. Porque tem sido mal governado, umas vezes. Mas sobretudo por permitir e alimentar uma economia paralela que não paga impostos, que sustenta o luxo e a ostentação de uns tantos, enquanto a economia real não tem um chavo para reparar uma estrada, para pagar reformas dignas aos mais pobres, para apoiar os mas carenciados.
A classe política, por muito que lhe custe ouvir, é a grande responsável por este estado de coisas. Os partidos políticos, alguns deles e com pena nossa alguns da área do poder, perderam a sua matriz de escola política, de magistério de valores e competências, de espaços de reflexão séria para encontrar soluções alternativas quando fossem chamados a governar. Viraram, alguns deles, escritórios das jogadas de bastidores, sucursais de influências, grandes superfícies de tachos na Administração pública.
Para se defenderem fizeram passar a ideia que dizer mal dos partidos é ser contra a democracia. Estou-me nas tintas para esse paleio. É tempo de dizer, de ter coragem de o afirmar, que os grandes inimigos da democracia são os partidos políticos que funcionam assim, que se permitem comportamentos reprováveis, que afastam do seu seio todos aqueles que ainda vão tentando remar contra a maré. O que se passa nesse mundo, sobretudo quando se avizinham eleições e tachos disponíveis, é uma autêntica vergonha. E essa é a razão por que se tem vindo a afastar da vida política activa uma boa parte da classe política mais capaz, mais competente, mais séria».
LINO VINHAL, IN CAMPEÃO DAS PROVÍNCIAS

Restrições

PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
O princípio de presunção de inocência é evocado de uma forma abusiva, desvalorizando os tribunais de primeira instância. A ideia foi ontem defendida pelos professores Vieira de Andrade e Vasco Pereira da Silva durante o colóquio que, desde ontem, celebra na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa os 30 anos da Constituição.
O professor da Faculdade de Direito na Universidade de Coimbra considerou na mesa-redonda Constituição e Justiça que o texto constitucional pode travar a acumulação de processos e consequente morosidade nos tribunais se livrar os juízes de "problemas que não deviam tratar".
"Ninguém deve ser condenado em caso de dúvida, mas não faz sentido que após um processo de dois ou três anos se chegue ao fim e se diga que há presunção de inocência", permitindo sempre o prolongamento dos processos através de recursos, explica o constitucionalista. O que está em causa, explica, é "a valorização dos tribunais de primeira instância". Uma ideia apoiada por Vasco Pereira da Silva, professor nas faculdades de Direito da Universidade de Lisboa e da Universidade Católica, que não vê nessa hipótese "uma desvalorização dos recursos".
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JUÍZES FORA DE CARGOS POLÍTICOS
Mantendo-se à margem desta discussão, Jorge Miranda, que moderava a mesa-redonda, preferiu constatar outras falhas na Constituição. O constitucionalista diz que "não há nenhuma querela constitucional" e recusa "o frenesim da revisão permanente em que a sociedade política, à mingua de outros temas, por vezes se entretém", mas não se coibiu de fazer as suas propostas. Miranda entende que a Constituição devia conter uma norma que "proíba absolutamente qualquer posição de juízes fora da magistratura". "Não pode admitir-se que um juiz seja director da Polícia Judiciária, secretário de Estado ou deputado", ou que assuma posições políticas, defende Jorge Miranda, que pretende deste modo "evitar que a magistratura acabe por ser vítima de jogos políticos".
Extractos de notícia publicada hoje no Público (ed.impressa)

Leituras recomendadas

DEFENSOR OFICIOSO
Um novo blogue de leitura recomendada.
Segundo o seu autor, trata-se de «um blog realizado no âmbito do patrocínio oficioso, na modalidade de dispensa total de taxa de justiça e demais encargos com o processo, (in)dependentemente de juízo sobre a existência de fundamento legal da pretensão…»
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AS MEDIDAS TOMADAS POR ALBERTO COSTA SÃO PERVERSAS
Entrevista de Júlio Castro Caldas ao Diário Económico.
O anterior bastonário da Ordem dos Advogados considera que a crise da Justiça passa por interiorizar na consciência política de todos os portugueses que o poder judicial deve ser organizado constitucionalmente de outra forma. Mais críticas ao Governo e às férias judiciais que foram um “anúncio demagógico e mal pensado.”A solução, garante o ex-ministro da Defesa de António Guterres, não passa por terapêuticas parcelares de mudança do sistema. Castro Caldas assume ainda que a actual estrutura da Ordem está desatenta em relação a aspectos fundamentais.
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TRIBUNAL DE V.CASTELO AMEAÇA RUIR
Um relatório elaborado pela Inspecção-Geral do Trabalho revela que o Tribunal de Trabalho e de Comarca de Viana do Castelo apresenta graves problemas de conservação, correndo mesmo o risco de ruir, o que põe em causa a segurança de quem ali trabalha e dos cidadãos.
:: Texto Integral no Correio da Manhã
O edifício não tem acessos para pessoas com mobilidade reduzida. Às vezes, são os médicos e o juiz que vão à rua ver os doentes à ambulância. Não há saídas de emergência, e a magistrada do Ministério Público nem fecha a porta para poder fugir em caso de sinistro.
:: Texto integral no Jornal de Notícias
:: Nada de novo que já não tivesse sido objecto de referência neste blogue em Novembro de 2005..., como bem o lembra o LexFundamentalis mas sem qualquer desenvolvimento até à data. Até que ocorra um desastre - neste ou noutros edifícios onde estão instalados tribunais - pouco interesse existe com quem serve e quem carece de percorrer os espaços destes órgãos de soberania...
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O TECTO PODE DESABAR EM CIMA DOS FUNCIONÁRIOS
“O tecto pode cair em cima dos funcionários”Rocha Neves, presidente da Delegação de Viana do Castelo da Ordem dos Advogados, explicou que, por causa da fragilidade, na sala de audiências não podem estar mais de 20 pessoas, o que até já levou o juiz a ser obrigado a “convidar” alguns dos presentes a sair “para evitar que aquilo desabasse na cabeça dos funcionários que trabalham no piso inferior”. O responsável disse que, apesar de a sala da Junta Médica ter apenas seis metros quadrados, “é lá que trabalham três médicos, um funcionário, um magistrado e um juiz”. O responsável pela IGT em Viana, Luís Castro, disse que o relatório foi enviado ao inspector-geral do Trabalho, “que se encarregará de o fazer chegar à tutela”
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TRÊS ANOS PARA RESPONDER AO PROVEDOR DE JUSTIÇA
O Governo levou três anos para responder ao provedor de Justiça sobre uma recomendação relativa ao salário dos magistrados judiciais e do Ministério Público. O parecer data de 2003 e aponta para a inconstitucionalidade de um tecto salarial criado em 1990 pelo então primeiro-ministro Cavaco Silva, hoje Presidente da República. A recomendação foi dirigida a Celeste Cardona, ao tempo ministra da Justiça, mas foi mudando de mãos já que a pasta esteve, até hoje, entregue a três políticos de cores partidárias diferentes.
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APROVADA REVISÃO DO CÓDIGO PENAL
À terceira foi de vez. Depois de ter estado por duas vezes prevista a sua apreciação, ontem foi finalmente aprovada, em Conselho de Ministros, a proposta de lei que altera o Código Penal. vigilância electrónica, que escapa à actual esfera preventiva e passa também a ser aplicável em penas até dois anos, particularmente para grávidas ou menores, assim como na recta final de penas mais longas.
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DESMATERIALIZAÇÃO
Diversos responsáveis do Ministério da Justiça se têm referido repetidas vezes a uma misteriosa realidade a que chamam a “desmaterialização dos processos”, sem nunca se perceber em toda a sua extensão o que pretendem dizer.Ultimamente andam a falar muito em “desmaterialização dos recursos”...
:: Texto integral (Informática do Direito)
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DESPLANTE
"(...) Tantas palavras e cálculos provisórios para dizer o óbvio: o governo vai dar mais uma cacetada nas pensões dos portugueses.Tantas desculpas para assumir o que todos os portugueses já perceberam: o Estado não vai cumprir o que prometeu a quem trabalhou uma vida inteira na expectativa de ter uma velhice tranquila (...)".
:: Texto integral (Mais Actual)

quinta-feira, abril 27, 2006

15 anos

Já são 15 anos sem revisão das remunerações dos magistrados judiciais e do Ministério Público.
À Recomendação n.º 1/B/2003 do Senhor Provedor de Justiça, respondeu desta forma o Senhor Ministro da Justiça.
A manter-se por muito mais tempo, esta discriminação negativa corre o risco de figurar nas páginas do Guiness Book.

terça-feira, abril 25, 2006

Inclusões e exclusões

No discurso de Sua Excelência o Senhor Presidente da República, aquando da celebração do 32.º aniversário do 25 de Abril, focou a necessidade de inclusão dos excluídos.
Totalmente de acordo.
No entanto, regista-se que, em mais um discurso oficial (o mesmo sucedeu no discurso aquando da sua tomada de posse) ocorre uma exclusão que não se compreende. Enquanto todos os representantes dos partidos com assento no Parlamento e Sua Excelência o Presidente da Assembleia da República (link) na sua evocação inicial respeitaram integralmente a ordem constitucional dos poderes soberanos do Estado, com menção expressa de Suas Excelências os Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça, do Tribunal Constitucional e dos Tribunais Superiores, já Sua Excelência o Presidente da República omitiu-o por completo.
Uma exclusão que a Constituição exige inclusão.

segunda-feira, abril 24, 2006

Credibilidade

António Pina, no JN de hoje (link)
«Os níveis de credibilidade a que chegou a instituição parlamentar, manifestamente incapaz de se auto-regenerar ou automoralizar, são inquietantes por ser, ou dever ser, a AR o coração político da Democracia.
O escândalo da "escapadinha" pascal de uma centena de deputados depois de assinarem a folha de presenças é apenas mais um degrau do descrédito do Parlamento, a acrescer aos das viagens-fantasma, dos privilégios auto-atribuídos (reformas, subsídios de reintegração, generosos regimes de incompatibilidades, e agora até um anunciado foro judicial especial..), da subserviência aos directórios partidários, dos inquéritos parlamentares sem consequências...
Aproveitando esse descrédito e apresentando-se como o campeão da ética e o grande educador da "classe política", Manuel Alegre amealhou nas recentes presidenciais mais de um milhão de votos de descontentes. Que terá pensado cada um desses votos ao descobrir que Alegre foi justamente um dos que assinaram a folha de presenças da AR e depois se "desenfiaram"? E ao ouvi-lo antecipar-se na Antena 1 às eventuais críticas de Cavaco afirmando que "Cavaco Silva não é o comandante supremo do regime"? (...)»

sábado, abril 22, 2006

A verdade nua e crua

ESTUDO DAS FÉRIAS JUDICIAIS:
Finalmente publicado o "famoso estudo" das férias judiciais.
Numa palavra: patético.
Nível de sofisticação: zero.
Qualidade técnica: tratamento de dados, aluno medíocre do 1.º ano de Economia.
In Reforma da Justiça, via Informática do Direito
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Comentário in "Informática do Direito":
«Mas afinal não há ninguém com coragem suficiente para assumir a paternidade do dito "estudo" ? O mesmo vai ficar ad aeternum filho de pai incógnito ? Então um "estudo" que começou por ser "credível" nas ministeriais palavras passou a ser de geração espontânea depois de se ter detectado que é patético e com um nível de sofisticação igual a zero ? Quem é que assume a responsabilidade pelas enormidades que lá constam ?»

Castração administrativa da justiça

O risco de castração administrativa da justiça
Por Dr. Paulo C. Rangel (Público, 19/04 - edição impressa)

«Há uma política sistemática de segmentação das várias funcionalidades da justiça, ligando-as directamente a diferentes braços administrativos e executivos, procurando reduzir o poder judicial ao momento estritamente técnico da produção do juízo em julgamento
1.Muitos foram os que vieram a terreiro criticar o Governo por não ter uma política de justiça, em face do crescente assomo de vicissitudes e episódios. Não existia - diziam - um programa coerente, assente numa visão global, para a área da justiça. Proliferavam as medidas localizadas e avulsas, sobrelevava a "toda milagrosa" redução das férias judiciais, anunciava-se a conta-gotas uma série de toques e retoques no ordenamento penal e processual. Não se pressentia nem se percebia um desígnio, um programa, uma visão reformista para o sector da justiça. O grave transe por que passa a Polícia Judiciária - e que está decerto mais longe do fim do que se imagina - tem, pelo menos, um mérito: o de pôr a nu a visão que o actual Governo tem da justiça. E mostrar que, por detrás daquele acervo aparentemente invertebrado de medidas e soluções, subsiste um pensamento estruturado e um desígnio político. Antes não subsistisse.
2. Tudo se precipitou - recordemo-lo - com a velada intenção de retirar à PJ o controlo das relações com as suas congéneres internacionais. Tal controlo passaria para um órgão administrativo central e centralizado - medida que, para já, mas só para já, foi congelada, aguardando dias mais propícios. Eis então uma medida - a intencionada - que, além de configurar um tremendo erro técnico, explicita toda uma concepção da política de justiça e, até, da política de segurança, senão mesmo da política em geral. O ponto que, de modo mais desabrido, enuncia e denuncia essa concepção vem a ser precisamente a sua contextualização no âmbito de um plano de reforma da administração pública. A que título e com que pertinência se discute o leque de competências de uma polícia de investigação criminal a propósito de uma reforma administrativa? Fará algum sentido que questões cruciais no nosso sistema processual penal, verdadeiras traves do Estado de direito, sejam integradas, sem debate comunitário, no "design" ou na "arquitectura" dos gabinetes deste ou daquele ministério (já que, em grande parte, é disso e apenas disso que se trata na dita reforma)?
3. Ao incluir sub-repticiamente questões substancialmente pertinentes à função soberana da justiça no quadro estrito da reforma da administração pública, subordinando-as à sua lógica e às suas exigências, o Governo revela uma ideologia "administrativizante" da justiça. Na verdade, existe um esforço contínuo e porfiado de deslocar para a esfera puramente "executiva" um conjunto de matérias que deveriam ser agregadas em torno daquilo a que poderíamos chamar, num Estado caracterizado pela separação dos poderes, a "centralidade" ou a "polaridade" do poder judicial.
Se a recolha e permuta de informação que serve a investigação criminal passa para a órbita da segurança interna, há "administrativização" da justiça. Se as escutas realizadas no inquérito passam a ser controladas, não por uma segunda instância, mas por uma comissão administrativa de fiscalização, confunde-se o poder judicial com o "bureau" de informações.
Se a redefinição de serviços da justiça como o notariado e os registos, com funções indeclináveis de prevenção da legalidade e fomento da segurança, é dissolvida numa política transversal de desburocratização, não se percebendo o sistema de vasos comunicantes estabelecido com os tribunais, acabará por se incrementar a litigiosidade.
Esta via "administrativizante" é bem visível, de resto, na linguagem dos actuais responsáveis políticos. Foi o antigo ministro António Costa quem mais disseminou e celebrizou a expressão "operadores judiciários", a qual, inapropriada como é, evidencia a perspectiva "utilitarista" do campo judicial.
E o actual ministro, Alberto Costa, usa e abusa, enquanto categoria de referência, da expressão "sistema judicial", articulando o discurso em redor de um paradigma "sistémico" de tipo "prestador", como quem lida com a "pura e neutra" administração e não com um poder constitucional.
Há, em suma, uma política sistemática de segmentação das várias funcionalidades da justiça, ligando-as directamente a diferentes braços administrativos e executivos, procurando reduzir o poder judicial ao momento estritamente técnico da produção do juízo em julgamento (ao "acto de julgar" tout court). Retomando as categorias de Dieter Simon, a justiça deixa de ser um poder para se convolar numa simples função. O que, uma vez alcançado, representará, em termos de qualidade da democracia, recuo e retrocesso.
4. Ora, para outra visão, para uma que fite o judicial como um poder constitucional de pleno direito, as funções "de justiça" devem ser organizadas em volta dessa "centralidade" do poder jurisdicional. As mudanças a efectuar não se deverão focar nas falhas passadas e na sua obsessiva reparação, mas na preparação de uma sociedade em que o papel político-institucional dos tribunais vai necessariamente avultar. Numa sociedade menos estatizada, mais internacionalizada, mais conflituante e plural, em que a máquina executiva todos os dias perde capacidade de intervenção e resposta, os tribunais e os serviços de justiça em geral tenderão a tornar-se, cada vez mais, instâncias de arbitragem social. Num quadro de separação dos poderes em que o legislativo e o executivo surgem federados e em que emerge toda a sorte de poderes fácticos, a função de balanço, equilíbrio e controlo do judicial antolha-se indispensável.
O que, portanto, não reclama um "acantonamento" administrativo ou burocrático, mas antes exige uma valorização institucional e política. Valorização que postula, por sua vez e ao contrário do que sustenta uma terceira visão (a corporativa), um reforço dos canais de comunicação democrática, isto é, mudanças sensíveis nos diferentes níveis de legitimidade e de aferição da responsabilidade. O perigo, por agora, porém, não parece ser o da inflamação corporativa, mas antes o da castração administrativa».

Calmex

EDITORIAL DE EDUARDO DÂMASO (DN)
«O ministro da Justiça disse ontem que a Polícia Judiciária precisa de "calma para trabalhar" de modo a poder "desempenhar ainda melhor a sua função" e, por isso, escusou-se a falar sobre a inviabilização da ida do ex-director nacional Santos Cabral à Assembleia da República. Ora, o que a Polícia Judiciária precisa agora foi exactamente aquilo que ao ministro da Justiça faltou quando foi ao Parlamento insinuar que a PJ trabalha mais para o arquivamento do que para a acusação e que a gestão financeira da casa tinha sido deficiente nos últimos tempos.
Alberto Costa não teve a "calma" suficiente para evitar que as suas palavras funcionassem objectivamente como um acto incendiário. Ao pronunciar-se sobre os níveis de eficácia da polícia e sobre uma alegada gestão financeira de que obviamente seria co-responsável, fê-lo de forma demagógica e num contexto em que só agravou a delicadeza política da situação para si próprio e para o Governo.
Foi demagógico porque não é atribuível ao juiz Santos Cabral qualquer particular responsabilidade na alegada deficiente gestão. Santos Cabral não terá sido muito diferente na gestão do que foram outros directores e ou- tras direcções. Simplesmente o quadro de disponibilidade financeira é aquele que é conhecido.
Com as acusações que deixou, Alberto Costa limitou-se a agravar o quadro de hostilidade por parte de todos quantos na magistratura são contrários à nomeação de magistrados para comissões de serviço. Por isso, aliás, a nomeação de um dos novos directores passou por uma unha negra no Conselho Superior de Magistratura. E esta é, aliás, uma questão que os magistrados deveriam encarar de forma mais consistente porque é óbvio que há magistrados a mais em comissões de serviço, há promiscuidade a mais entre magistrados e partidos e nada disso é saudável para a democracia.
Por outro lado, quando Alberto Costa diz que quer uma polícia que trabalhe mais para acusações do que para arquivamentos, tem toda a razão. A realidade, porém, não acompanha o ministro em todas as áreas de combate à criminalidade, a responsabilidade dos arquivamentos não é exclusiva da PJ e, por fim, Alberto Costa e o seu partido não são propriamente estreantes em matéria de responsabilidades na definição de políticas de combate à criminalidade e de gestão na área judicial. Em matéria de calma, portanto, o ministro não tem ajudado muito».

Estudo arrasado

A redução das férias judiciais de dois para um mês vai provocar a diminuição de produtividade dos juízes em 1,6 por cento. Esta é a conclusão a que chegou o juiz Paulo Ramos de Faria após ter analisado o estudo do Ministério da Justiça (MJ) que esteve na base da alteração das férias judiciais.
O magistrado do Porto diz que recorreu “às mesmas premissas” utilizadas pelo MJ quando concluiu que só um mês de férias originava um aumento de dez por cento na produtividade dos Tribunais. Segundo Paulo Ramos de Faria, o “simples” facto de os juízes deixarem de trabalhar durante as férias judiciais - “nessa altura, Agosto, estão a gozar férias pessoais” - faz com que os dez por cento de produtividade “reclamada” pelo MJ “passem logo” para apenas 6,6 por cento. ”Posso prová-lo recorrendo ao número de processos findos de 1998 a 2005 nas duas quinzenas de maior produtividade: 15 dias em Julho e 15 dias em Setembro. Os magistrados aproveitavam esses períodos de férias judiciais para porem o trabalho em dia. E os números dizem que, em relação aos restantes meses do ano, a produtividade, nessa altura, aumentava 34 por cento. E isso vai perder-se”.
Ramos de Faria considera, ainda, que ao ser permitido que os magistrados gozem 12 dos 27 dias de férias a que têm direito durante o período normal do funcionamento dos tribunais tem um custo de 5,5 por cento na “questão da produtividade”. “Contas feitas, de acordo com as premissas do Ministério, a redução das férias já só dá um benefício de 1,1 por cento”
E acrescentou: “Mas também temos de salientar que a Lei 42/2005, de 29 de Agosto, dá mais seis dias por ano de dispensa de serviço aos juízes, que não podem ser juntos às férias normais nem utilizados todos de seguida. Segundo o estudo que o Governo divulgou, esses seis dias a mais correspondem a uma perda de produtividade de 2,7 por cento. Ou seja, 1,1 menos 2,7 é igual a menos 1,6”.
O juiz do Porto fez ainda questão de sublinhar que o novo regime de férias beneficia os “operadores judiciários”. “Mas é muito mau para o cidadão que tem de recorrer à Justiça. No entanto, o exercício que efectuei partiu de conceitos e números que considero inadequados, pelo que as minhas conclusões terão a mesma validade que o estudo do Ministério Justiça”, concluiu Paulo Ramos de Faria.

Problema resolvido

«Qual redução do número de parlamentares...
Qual caminhar para a exclusividade do exercício da função...
Quais mudanças no regimento...
Quais alterações no estatuto dos deputados ou nas leis eleitorais....
Alterar a lei, em vez de se alterar a maneira como cada um exerce a sua função....
Qual incutir esforço, dedicação, profissionalismo, empenho, trabalho...
O líder da bancada parlamentar do PS, Alberto Martins, propôs ontem a redução de três para duas o número de sessões plenárias por semana.
E já agora uma ajudinha, de preferência, eliminar aquela que estiver mais perto do fim de semana, ou mesmo sessões plenárias móveis para não interferir com "pontes" e para não voltarem a ser notícia...»

quinta-feira, abril 20, 2006

Conselheiro Araújo de Barros

Faleceu o Juiz Conselheiro Dr. Araújo de Barros.
O corpo encontra-se em câmara ardente na Igreja de Santa Maria de Avioso, Maia. O funeral realiza-se amanhã, pelas 16 horas.
À Exma. Família, apresentamos os nossos sentidos pêsames.

Decréscimo de 1,6% de produtividade

Afinal, partindo das premissas do célebre "estudo" alegadamente "encontrado" pelo Ministério da Justiça, e usando o mesmo raciocínio do aludido estudo, a redução do período das férias judiciais implica um decréscimo de 1,6% da produtividade.
Quem o demonstra é o Dr. Paulo Ramos de Faria, neste brilhante "Estudo 3 Simplex"...
De leitura «obrigatória».

terça-feira, abril 18, 2006

Governo não tem estratégia na Justiça

ENTREVISTA DE DR. BRUTO DA COSTA AO CORREIO DA MANHÃ
Bruto da Costa, juiz desembargador, diz que os tribunais não podem ser comparados a fábricas de chouriços.
Texto e Foto (c) Correio da Manhã
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Correio da Manhã – No blogue Informática do Direito escreveu ontem que há quem pense que um tribunal ou uma Polícia de investigação podem ser comparados a fábricas de chouriço. Quem é que pensa assim?
Bruto da Costa – Todas as pessoas que encaram os tribunais apenas do ponto de vista da produtividade judicial e das valências numéricas. Refiro-me, concretamente, a quem, no Ministério da Justiça, elaborou o estudo que justificou a alteração das férias judiciais.
– Que opinião tem desse estudo do Ministério da Justiça?
– Em relação à forma, é um estudo anónimo e não datado. Quanto ao conteúdo posso dizer que não é convincente. Desconhece a realidade dos tribunais. Refere-se a determinados factores em que o autor mostra que não sabe do que está a falar. Por exemplo: quando eles indicam a produtividade judicial aos fins-de-semana e durante as férias, espalham-se completamente. Desconhecem que um juiz ao datar o trabalho – despacho ou sentença – feito no fim-de-semana em 99 por cento dos casos coloca a data da sexta-feira anterior ou do dia útil subsequente.
– O que é que o Governo, em relação à Justiça, ainda não percebeu?
– É tanta coisa que me custa responder. Mas vou apontar três questões que não compreendeu: o funcionamento interno dos tribunais; o brio profissional da magistratura; e a vontade de bem fazer de muita gente ligada aos tribunais.
– O culpado do que está a suceder na Justiça é o ministro Alberto Costa?
– Não se pode dizer isso. Não há um grande culpado. Há muitos. São todos os responsáveis pela área da Justiça de há trinta anos a esta parte.
– Qual é o pior ministro desde o 25 de Abril de 1974?
– Não sei. São todos altamente competitivos a esse nível.
– Alberto Costa tem condições para continuar como ministro da Justiça?
– Não sei o suficiente de política para fazer essa avaliação. Mas acho que ele deve estar numa posição desconfortável. Eu estaria, se sentisse que todo um sector que estou a tutelar me é franca e abertamente hostil.
– Aconselhava-o a renunciar ao cargo?
– Não lhe dou qualquer recomendação (...) Apenas digo que este Governo, para além da propaganda, não tem uma política nem uma estratégia para a Justiça. Se se descascar uma a uma as políticas que vão sendo anunciadas concluímos que a maioria são óbvias. É o caso da simplificação processual e melhores níveis de produtividade. Todos queremos que seja assim. Quando se quer compreender alguma especificidade real da estratégia do Governo para a Justiça, descobre-se imediatamente que não há. Este Governo anda ao sabor dos acontecimentos.
– Que conselho dá ao ministro da Justiça?
– Seriam tantos... Enfim, que tente compreender as pessoas que falam com honestidade. Há uma multiplicidade de magistrados que têm falado com o coração nas mãos e sem qualquer partipri.
– Não o choca ter um ministro da Justiça que no passado foi acusado de tentar influenciar um juiz?
– Não considero a pressão uma actividade ilegítima. Os juízes são decisores e os decisores são sempre pressionados de diversas maneiras.
– Já foi pressionado pelo poder político?
– Não.
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TRIBUNAIS E FÁBRICAS DE CHOURIÇOS
«Há quem pense que um Tribunal ou uma polícia de investigação podem ser equiparados a fábricas de chouriços – entram 500 kg de carne, têm de sair 500 kg de chouriços. Em dois ou três dias de trabalho de férias o juiz consegue produzir (...) o equivalente ao que produziria em duas ou três semanas de trabalho em tempos normais.(...) A actividade do juiz não é ‘matar processos’, é resolver questões e situações. Fonte: Blogue Informática do Direito»

Juízes contra comissão de serviço

«A nomeação do juiz José Moreira da Silva para director adjunto da Polícia Judiciária pode estar presa pelo sentido de voto dos três nomes indicados pelo PSD para o Conselho Superior da Magistratura (CSM).
Este órgão vai realizar na próxima quinta-feira um plenário extraordinário para discutir a nomeação. E nesta reunião já estarão presentes Laborinho Lúcio e Costa Andrade, na qualidade de membros indicados pelo actual Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.A antecipação do plenário (agendado para 2 de Maio) deveu-se à controvérsia gerada no seio do CSM pelo facto de o vice-presidente, juiz-conselheiro Santos Bernardino, estar a contactar telefonicamente os membros do CSM indicados por Jorge Sampaio (o juiz-conselheiro Sampaio da Nóvoa e Guilherme da Palma Carlos) para recolher a sua posição quanto à escolha do juiz José Moreira da Silva para director ajunto da PJ. Aliás, como o próprio Santos Bernardino admitiu ao DN (ver edição de 13 de Abril).
A correlação de forças, segundo fonte do CSM, estará muito equilibrada entre os votos favoráveis e contra a nomeação. É que se a um bloco de cinco juízes, que se preparam para votar contra, se juntarem os votos dos três membros indicados pelo PSD - Eduardo Vera Cruz Pinto, José Luís Moreira da Silva e João Calvão da Silva -, a nomeação pode ser chumbada ou, de acordo com um segundo cenário, passar por uma diferença de um ou dois votos. Até porque não são conhecidas as posições que Laborinho Lúcio e o penalista Manuel da Costa Andrade tomarão.
Sendo certo que, daqueles três elementos, Eduardo Vera Cruz Pinto tem assumido no CSM uma posição contra as comissões de serviço dos juízes. "Sempre votei contra as comissões de serviço quando não está expresso na lei que deva ser um juiz a exercer o cargo. Podem afectar a dignidade estatutário-institucional da magistratura judicial, não tendo a ver com a sua formação para o exercício da judicatura ou para a melhoria do serviço público de justiça", disse Eduardo Vera Cruz Pinto, numa declaração de voto a propósito da nomeação do juiz Antero Luís (em Outubro de 2005) para a direcção do Serviço de Informações e Segurança (SIS).
A escolha do Governo deverá contar com os votos favoráveis dos elementos indicados pelo PS e por alguns juízes, entre os quais o vice-presidente do CSM, Santos Bernardino.
O grupo de cinco juízes, do qual fará parte o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, conselheiro Nunes da Cruz, deverá alegar na respectiva declaração de voto que o processo de demissão do juiz-conselheiro Santos Cabral não foi o mais transparente, assim como não deverão aceitar o facto de um juiz, José Moreira da Silva, estar na dependência de um magistrado do Ministério Público, Alípio Ribeiro.
A reacção negativa dos juízes a uma nomeação do Governo para a PJ não é uma novidade no CSM. Já em 1999, na sequência da demissão do então director nacional Fernando Negrão, o CSM não aprovou a escolha de Santos Cabral, escolhido pelo então ministro da Justiça Vera Jardim. José Moreira da Silva é actualmente juiz no círculo de Vila Franca de Xira. Passou pelos tribunais de Paredes, Penafiel e por uma comissão de serviço no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras».

Exclusividade dos deputados

O constitucionalista Jorge Miranda defendeu hoje a introdução do regime de exclusividade no estatuto dos deputados, em conjugação com a limitação de mandatos, considerando que estas duas medidas darão garantias de uma maior independência dos parlamentares.
"Cada vez mais defendo a exclusividade parlamentar que, ligada à limitação de mandatos, dará uma garantia de independência", afirmou Jorge Miranda - que foi deputado à Assembleia Constituinte, em 1975/76 -, numa intervenção no colóquio "Ética e Política", que decorre hoje e amanhã na Assembleia da República.
O regime das incompatibilidades foi outra das questões abordadas pelo constitucionalista, que contestou a possibilidade de os deputados aceitarem cargos públicos."Um deputado não pode aceitar nenhum cargo proveniente de outro órgão público", disse, apontando como exemplo cargos de gestor público e defendendo a introdução desta regra na legislação.
Ainda no âmbito do exercício de cargos públicos, Jorge Miranda considerou que "também não se devia permitir que um juiz de carreira exerça qualquer cargo de nomeação governamental", dando como exemplo a nomeação do juiz Alípio Ribeiro para director nacional da Polícia Judiciária.

domingo, abril 16, 2006

Férias judiciais e fábricas de chouriços

«(...) O “estudo” atribuído ao Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Justiça sobre o impacto da redução das férias judiciais que norteou o Governo nas medidas que tomou é um estudo desse género, que atribui valências numéricas às mais variadas situações e parte daí para conclusões absolutamente extraordinárias.
O dito “estudo” desconhece desde logo uma realidade, qual seja o trabalho que em férias costumava ser efectuado por magistrados e funcionários.
Um Juiz que se dispõe a trabalhar em férias sabe que não vai ter diligências, não vai ter atendimento de pessoas, não vai ter telefonemas, não terá de enfrentar a quantidade de factores de dispersão de atenção que sobre ele caem no dia a dia profissional.
O trabalho desenvolvido em férias vai quase exclusivamente para tratar de casos mais complicados que implicam mais estudo e investigação – e como não existem os aludidos factores de dispersão esse trabalho tende a ser mais perfeito emuitíssimo mais produtivo.
Se pensarmos que o expediente e as diligências chegam a ocupar 90% do tempo de trabalho diário, deixando apenas 10% do tempo para o despacho e a sentença de fundo, facilmente concluímos que em férias o despacho e sentença são efectuados não só com maior qualidade, mas principalmente com uma enorme produtividade relativamente à que se verifica em tempos normais de serviço judicial.
Ou seja, em 2 ou 3 dias de trabalho de férias o Juiz consegue produzir a nível de despacho e sentença o equivalente ao que produziria em 2 ou 3 semanas de trabalho em tempos normais, atingindo elevadíssimos níveis de produtividade.
Qualquer estudo de produtividade judicial que não tenha este fenómeno em consideração está inquinado de origem.Voltando à fábrica de chouriços: eu não sabia que a actividade judicial se media pelo número de processos findos per capita – pensava, sabe-se lá porquê, que a actividade do Juiz não é “matar processos”, é resolver questões e situações" (...) ».
Juiz Desembargador Dr. Bruto da Costa, in Informática do Direito

sábado, abril 15, 2006

De A a Z

Propaganda (ou segundo os mais modernos conceitos, "marketing") do Ministério da Justiça, de A a Z (ficheiro em PDF).
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Certamente por lapso de escrita, numa mais emblemática medidas, do rol das 100 apresentadas no documento, consta a redução das férias judiciais ... como para "descongestionamento dos Tribunais" (?!?). Na edição do próximo ano, este lapso de escrita será corrigido para "congestionamento dos Tribunais".

sexta-feira, abril 14, 2006

Desmistificar a confusão

1. Constança Cunha e Sá teve a lucidez de compreender e de escrever no seu artigo de opinião publicado hoje no Público (apenas edição impressa), que «duas ou três declarações demagógicas sobre os privilégios dos magistrados não substituem uma política que não existe, nem afastam as suspeitas sobre a governamentalização do poder judicial que parece estar em curso».

2. A perspicácia da Autora é bem patente noutra parte do seu artigo: "De forma menos visível, e sem discursos oficiais a enfeitar a iniciativa, o Governo tentou substituir o procurador-geral da República, que se transformou no bode expiatório do regime a partir do momento em que surgiu o processo da Casa Pia".
E ainda: «Curiosamente, a grande novidade legislativa, a criação de um "foro especial" para os titulares de cargos políticos, que passarão a ser julgados apenas por juízes da Relação, foi acolhida com indiferença, se não com simpatia, pela generalidade dos comentadores. Salvo raras excepções, o estatuto privilegiado dos políticos não incomodou nenhuma das almas que se indigna semanalmente com o aumento da corrupção e a proliferação do crime económico».
Ainda bem que ainda existem pessoas que não prescindem de pensar por si e de ter a sageza e a coragem de escrever o que outros procuram deturpar.

3. Todavia, a campanha populista e demagógica de que Constança Cunha e Sá bem enuncia, ainda deixa as suas marcas e no mesmo artigo - certamente derivada da aludida propaganda de desinformação e de deslegitimação - a Autora escreve que «A "crise" acentuou-se com o Governo do eng. Sócrates e o seu corajoso ataque aos benefícios inqualificáveis que floresciam na magistratura: a simples ideia de que o primeiro-ministro tencionava acabar com as férias prolongadas de um pequeno grupo de cidadãos rendeu-lhe doses acrescidas de popularidade num país sensível à demagogia política e atreito à pequena inveja que nele sempre prosperou».

4. Ora aqui é que importa desmistificar a confusão ainda reinante entre férias judiciais e férias de juízes (ou férias dos profissionais forenses).

4.1. Férias judiciais não são férias de juízes. Os Tribunais estão sempre abertos, mesmos nas férias judiciais, todavia apenas correm prazos nos processos urgentes. No
estudo sobre férias judiciais nos países europeus, realizado pelo GPLP do Ministério da Justiça, verifica-se que são vários os países da Europa que têm dois e mais meses de férias judiciais no verão, precisamente para permitir a rotação das férias pessoais de todos os profissionais. Além disso, verifica-se que o número de dias de férias pessoais dos juízes portugueses está no liminar mínimo, comparando-se com os mesmos países europeus (cfr. quadro comparativo).

4.2. Os juízes e os profissionais forenses têm apenas e tão só os mesmos dias de férias pessoais que qualquer agente do Estado ou da Administração Pública (25 dias úteis, com os acréscimos legais decorrentes da antiguidade ou idade).
Porém, ao contrário dos demais agentes do Estado, os profissionais forenses estão impedidos de escolher, ao longo do ano, o seu período de férias pessoais, pois estão circunscritos a escolher no período das férias judiciais, agora de 1 a 31 de Agosto ou, por força da observância de turnos, também podendo antecipar as férias pessoais (25 dias úteis) no máximo até 15 de Julho. Trata-se da "época alta" dos destinos turísticos nacionais e estrangeiros. Apenas poder ter férias pessoais em Agosto é privilégio?

4.3. Os juízes e os funcionários judiciais têm reclamado o fim total das férias judiciais. O sistema das férias judiciais em nada os beneficia, apenas os prejudica e, como qualquer outro cidadão, querem gozar férias - apenas as que têm direito - mas poder fazê-lo também como qualquer outro cidadão, escolhendo o(s) seu(s) período(s) de férias, sem estarem entricheirados no mês de Agosto.
E se é privilégio, questiona-se por que o Governo não extingue pura e simplesmente as férias judiciais ? Os cidadãos - juízes incluídos - agradecem.

5. Afinal, como alvitra Constança Cunha e Sá, «um ano depois de o eng. Sócrates ter tomado posse, o país não conhece os objectivos do Governo em matéria de justiça». Parece que afinal, tudo se reconduziu a diminuir um período de férias judiciais que, ao contrário do que foi anunciado, está a gerar uma confusão na gestão de férias pessoais dos profissionais forenses, acantonados que estão no calendário, sendo mais que previsível uma efectiva diminuição da produtividade ... apenas porque agora não prescindem de gozar as suas férias pessoais, a que todo o cidadão tem direito.

Uma mão tira à outra

O "Diário Económico" noticia hoje que o Governo deverá reforçar o orçamento da PJ com 8,9 milhões de euros, resultantes do pagamento de taxas de justiça, custas judiciais e receitas de notários públicos. Com base num documento do Ministério da Justiça, o jornal refere que o reforço financeiro não terá origem no Orçamento do Estado para 2006, mas no Cofre Geral dos Tribunais do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial do Ministério da Justiça.
"É inevitável que haja um reforço da verba para a Polícia Judiciária, o problema é a origem da receita. O Governo vai retirar verbas onde elas fazem também muita falta. O aparelho judicial debate-se com uma situação aflitiva", afirmou António Filipe, em declarações à Lusa.
"Vai tentar-se colmatar um défice abrindo outro défice, nos tribunais", criticou, considerando que "seja qual for a solução a encontrar, o Governo tem de resolver o problema que criou".

Newsletter 3/2006

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Comentário à medida n.º 111 do "Simplex"
Por Dr. João Alves, Procurador-Adjunto e Docente no Centro de Estudos Judiciários.
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Por Dr. Joel Timóteo Ramos Pereira, Juiz de Círculo.
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Sobre o artigo 5.º n.º 2 do Código da Estrada
Por Dr. António Ferreira Ramos, Advogado
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•• Conferência - Direito do Trabalho: férias, feriados e faltas, 27 de Abril
•• O novo Regime do Arrendamento Urbano - Colóquio sobre a Reforma do RAU, 28 e 29 de Abril de 2006.
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Recortes

DEPUTADOS GANHAM 13 MILHÕES DE EUROS
A Assembleia da República prevê gastar, em 2006, 13,3 milhões de euros com os salários, subsídios de Férias e de Natal e ajudas de custo aos 230 deputados, verba que representa cerca de 10 por cento da despesa corrente total de quase 141 milhões de euros.
Nos últimos três anos, o Parlamento gastou em salários, subsídios de Férias e de Natal e ajudas de custo um total de 39,7 milhões de euros: 12,8 milhões em 2004, 13,6 milhões em 2005, e as previsões apontam para que em 2006, segundo o orçamento da Assembleia da República para este ano, sejam gastos 13,3 milhões de euros.
Só em ajudas de custo, que são atribuídas por deslocações em território nacional e ao estrangeiro em serviço do Parlamento, os parlamentares receberam nos últimos três anos entre 2,3 e 2,5 milhões de euros, o que dá a cada um entre 10 mil e cerca de 11 mil euros por ano.
:: Ver texto integral (C.M.)
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REFORÇO DO ORÇAMENTO DA PJ
O Governo deverá reforçar o orçamento da Polícia Judiciária (PJ) com 8,9 milhões de euros, resultantes do pagamento de taxas de Justiça, custas judiciais e receitas de notários públicos, noticia hoje o "Diário Económico".
Com base num documento do Ministério da Justiça, o jornal refere que o reforço financeiro não terá origem no Orçamento de Estado para 2006, mas no Cofre Geral dos Tribunais do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial do Ministério da Justiça.
:: Ver texto integral (Público)
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MAGISTRADOS DO MP LANÇAM ATAQUE À NOVELA DA TVI
Maus Tratos - ‘Dei-te quase tudo’ dá um 'Péssimo exemplo'. «Bêbado e agressivo, ‘Gonçalo’ vai prometendo deixar de beber e bater na jovem ‘Sara’, a mulher com quem vai ter um bebé e está casado há pouco mais de um ano. Não resiste à tentação e, meses a fio, o drama repete-se à chegada a casa. Em ‘Dei-te Quase Tudo’, telenovela da TVI em horário nobre, ‘Sara’ foge para longe de Lisboa aconselhada pelos amigos, porque “não ganha nada em queixar-se à Polícia”».
Um exemplo que, para dois magistrados do Ministério Público, Carlos Figueira e Plácido Fernandes, “é péssimo para a sociedade” no combate a “um dos grandes flagelos do século – a violência doméstica”. E, ainda por cima, tratando-se de uma novela “vista diariamente por dois milhões de pessoas”. Os dois procuradores e a comandante operacional da PSP da Amadora, comissária Nery, consideram que a fuga só pode acontecer em situações extremas, “perante a indesejável ineficácia do sistema”.
:: Ver texto integral (C.M.)
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DUAS FRASES
«(...) Por motivos fáceis de explicar, qualquer governo considera que a melhor forma de resolver um problema é mudar a lei: em Portugal, um país onde sobram problemas e não abundam soluções, muda-se a lei à velocidade com que se muda de ministro, na esperança que fique, pelo menos, uma "marca" pessoal numa área onde tudo continua na mesma. A legislação nacional, tão caótica como a administração pública que o Governo pretende racionalizar, está impregnada de "marcas" de ministros que, na impossibilidade de deixarem uma obra, se imortalizaram nos códigos à custa de uma sobreposição de leis que arrasa qualquer esperança de coerência e de continuidade».
«(...) Duas ou três declarações demagógicas sobre os privilégios dos magistrados não substituem uma política que não existe, nem afastam as suspeitas sobre a governamentalização do poder judicial que parece estar em curso.
:: CONSTANÇA CUNHA E SÁ, IN PÚBLICO (ED. IMPRESSA)

Poder político quer poder judicial dócil

PODER POLÍTICO QUER TORNAR "MAIS DÓCIL" O PODER JUDICIAL
Entrevista de Juiz Desembargador Dr. António Martins, Presidente da ASJP, ao Diário Económico (link)
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Juízes são o bode expiatório para os males da Justiça , diz António Martins, mas uma nova greve “não está nos horizontes” da associação sindical.
António Martins, recém-empossado presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, justificou a sua candidatura ao cargo como uma forma de inverter a situação no que respeita ao Estado de Justiça. Agora, aponta como inimiga a descrediblização dos juízes para propósitos que não são muito saudáveis, como a influência de outros poderes para tornar o poder judicial mais “dócil.”
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DE - A anterior direcção sindical foi várias vezes acusada de mover uma guerra contra o ministro Alberto Costa. A linha, a partir de agora, será igualmente crítica?
AM - Cada pessoa é uma pessoa. Não andarei à procura de paralelismos ou diversidades. A relação com o ministro da Justiça passará por dois aspectos: exigência da nossa parte de respeito e disponibilidade para com os juízes. Nomeadamente a disponibilidade para os juízes se assumirem como peças essenciais em termos de perspectivas de reformas para melhoria do sistema de Justiça.
Houve falta de respeito de Alberto Costa para com os juízes?
Houve uma atitude de tentativa de deslegitimação do poder judicial e uma tentativa de colocar nas costas dos juízes o mau funcionamento do sistema de Justiça. Colocaram-nos como bode expiatório dos males da Justiça.
A independência dos juízes está ameaçada com este Governo?
O que existe é a ideia de descredibilização dos juízes para propósitos que não são muito saudáveis.
E que são...
Ter um poder judicial dócil e sujeitos a influências de outros poderes. E as medidas da carreira plana, a responsabilização dos juízes através do direito de regresso são exemplo disso.
Como viu a greve dos juízes de Outubro?
A greve dos juízes tem sempre que ser excepcional. E esta foi a segunda vez em 32 anos de democracia. Esta direcção actual não tem nos seus horizontes a realização de qualquer greve. No que respeita à greve de Outubro, acho que foi tarde demais. Deveria ter sido logo em Junho – quando estava em causa a deslegitimação do poder judicial. Ter-se-ia conseguido uma coisa que infelizmente não se conseguiu: passar a mensagem que a greve tinha a ver com questões essenciais do poder judicial e não com questões marginais como a redução das férias judiciais ou com os serviços sociais do MJ.
Como vê a demissão de Santos Cabral da direcção da PJ?
O que aconteceu foi um pedido de cessação de funções por parte da direcção da PJ. E mais uma vez o Ministério da Justiça pretendeu transmitir uma falsa ideia que houve uma demissão por parte de Alberto Costa. E vejo com preocupação que isto surja pela possibilidade de a Interpol e a Europol passarem para a alçada da PCM. Não sei o fundamento desta decisão, mas pode ser por ignorância ou má fé. Por ignorância ou por não se compreender o que essas unidades significam em termos de polícia e o que são realmente.
Concorda com a contingentação dos processos, já defendida por Alberto Costa?
Não é uma questão de concordar. É uma questão de os juízes estarem disponíveis para colocar em cima da mesa todas estas questões. Os juízes não estão aqui para defender privilégios, mas sim para servir a Justiça.
Como classifica a exigência, feita pela Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, para que o MJ disponibilizasse o estudo que serviu de base à redução das férias judiciais? Veio tarde de mais?
Já passou o prazo. Há muito tempo que um colega nosso pediu que lhe fosse disponibilizado este estudo, invocado pelo MJ com o argumento técnico de conseguir um ganho de produtividade de 10% com a redução das férias judiciais. E já há muito tempo decorreu o prazo que a lei prevê para apresentação desse estudo. Por isso, este cidadão juiz apresentou a queixa à Comissão que referiu. Não sei se esse estudo existe. E mesmo que exista, não sei se é um mero estudo de mercearia.
Num quadro de alteração do mapa judiciário, quais vão ser as propostas da ASJP?
Esta questão é uma das matérias sobre que o Gabinete de Estudos e Observatório dos Tribunais – que pretendemos criar – se vai debruçar. Teremos respostas através de um documento que pretendemos apresentar ao ministro da Justiça. Defendemos que não se pode fazer uma revisão do mapa judiciário de uma forma economicista – vamos extinguir comarcas que não têm volume processual elevado e passar os juízes para os que têm processos a mais. Porque a Justiça é um bem de primeira necessidade e o Estado não pode abdicar de o fornecer. Na óptica da magistratura, os juízes estão cá para realizar Justiça e estão disponíveis para encontrar fórmulas de melhoria da Justiça. Passa por se encontrar um ‘ratio’ de trabalho adequado – e o número de processos que cada juiz tem é o elemento que queremos introduzir. Cada juiz deve ter um determinado número de processos.
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CRÍTICAS AO GOVERNO E NOVAS PROPOSTAS
1 - Disponibilização do estudo que serviu de base à redução das férias judiciais
Já passou o prazo. Já há muito tempo que um colega nosso pediu que lhe fosse disponibilizado este estudo, invocado pelo MJ com o argumento técnico de conseguir um ganho de produtividade de 10% com a redução das férias judiciais. E já há muito tempo decorreu o prazo que a lei prevê para apresentação desse estudo. Por isso, este cidadão juiz apresentou a queixa à Comissão que referiu. Não sei se esse estudo existe. E mesmo que exista, não sei se é um mero estudo de mercearia.”
2 - Nova proposta para a gestão de financiamento dos Tribunais
“Sinceramente conheço muito pouco da proposta e o que tive acesso não é nada de diferente do que já acontecia. Já no tempo de António Costa o Instituto de Gestão Financeira concentrava os pagamentos e os procedimentos e desempenhava uma macrocefalia nesta matéria financeira dos tribunais. Não vejo nenhuma novidade naquilo que é apresentado como uma gestão nova.”
3 - Formação do CEJ, que acumula a formação da magistratura judicial e do MP
Nós propomos no nosso programa sufragado a separação entre as áreas de formação da magistratura do Ministério Público e da magistratura judicial. Quando se concorre para o CEJ já se concorre ou para juiz ou para o Ministério Público. Não faz sentido a situação como está actualmente. Não se pode estar à espera do último ano para se decidir para qual das magistraturas se vai seguir.
4 - Desmaterialização dos processos anunciada pelo Governo
“Eu já nem sei o que o ministro Alberto Costa quer sobre esta matéria. Inicialmente, a expressão utilizada era a “desmaterialização dos processos. Mas depois houve uma mudança no discurso dele - começou a falar de desmaterialização de recursos. Não sei sinceramente o que o Ministério da Justiça quer fazer nesta matéria”, acrescenta António Martins.
5 - Falta de meios informáticos para os tribunais e juízes
“Ao contrário da ideia de que os juízes são avessos a mudanças ou problemáticos com as novas tecnologias, a verdade é esta: pese embora o esforço do Ministério no que respeita à formação, a verdade é que são raros os juízes que ainda escrevem as sentenças à mão. Muitas vezes o que falta são mesmo os meios técnicos – porque há muitos colegas a trabalhar com computadores de primeira geração.”
6 - Contingentação dos processos por juízes proposta pelo Governo. Concorda?
“Não é uma questão de concordar. É uma questão de os juízes estarem disponíveis para colocar em cima da mesa todas estas questões. Os juízes não estão aqui para defender privilégios, mas sim para servir a Justiça.“
7 - As medidas de António Martins para os juízes
Sistema de contingentação ponderada de processos; criação de uma bolsa de juízes; reorganização do mapa judiciário; exigência de regras de clareza no sistema de concursos para acesso aos Supremos Tribunais; abertura de vagas e colocações de juízes.

quinta-feira, abril 13, 2006

O estudo encontrado no futuro

1. Na Reunião Plenária da Assembleia da República de 28 de Julho de 2005, foi por Sua Excelência o Senhor Ministro da Justiça, e por diversas vezes, feita referência a um "Estudo" que estaria na base da decisão governamental de propor ao Parlamento a redução as férias judiciais de Verão - decisão esta que veio a tomar forma através da Lei n.º 42/2005, de 29 de Agosto - , de acordo com o qual a redução destas férias para um mês seria susceptível de gerar um aumento de 10% da "produtividade" dos Tribunais.
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2. Nessa ocasião, Sua Excelência o Senhor Ministro da Justiça invocou o referido "Estudo", dizendo: «O estudo e os resultados que nos foram apontados como estimativas resultam de um gabinete que existia à nossa chegada ao Ministério, dirigido por uma personalidade que não fomos nós que seleccionámos ou designámos e que, portanto, nos tem de merecer toda a credibilidade» - cfr. o Diário da Assembleia da República, Série I, n.º 42, da 1.ª Sessão Legislativa da X Legislatura, de 29 de Julho de 2005, fls. 1847.
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3. No entanto, o estudo finalmente disponibilizado no site do MJ contém a data de Abril de 2005, quando o actual Governo tomou posse em Março de 2005. Como poderia o estudo que já existia antes da data da chegada de Sua Excelência, o Senhor Ministro da Justiça ao respectivo Ministério, apenas ter sido elaborado depois da sua chegada (isto a acreditar que a data nele aposta corresponde efectivamente à data em que o mesmo foi elaborado) ?
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4. E, além disso, se o estudo em causa foi "encontrado" pelo Senhor Ministro da Justiça quando o mesmo chegou ao Terreiro do Paço (em Março de 2005), como é que no item "Compilação de Documentos e materiais sobre avaliação do impacto da medida", surge uma citação da Constituição da República Portuguesa, Tomo I, anotada por Jorge Miranda e Rui Medeiros, quando esse livro apenas foi publicado em Abril de 2005, na sua 1.ª edição ? Mas mesmo assim, acreditando que o documento em causa foi mesmo elaborado em Abril de 2005 [e deste modo já não havendo correspondência com o referido no ponto 2], para o Gabinete anterior ou mesmo o actual ter elaborado o documento nesse mês, teve necessariamente que lhe ser atribuído o privilégio especial de o comprar directamente no prelo.
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Interessante, não é ? Um estudo verdadeiramente "encontrado" no futuro.

A verdade dos números

Afinal, e tomando exclusivamente por base o alegado "estudo" sobre férias judiciais disponibilizado pelo MJ no seu site e que serviu de arma para a campanha de propaganda no ano transacto, designadamente para apontar aos juízes a detenção de um privilégio, a verdade dos números é aterradora.
Não só em Portugal o período das férias judiciais não difere muito de muitos países europeus, como na sua globalidade, os juízes portugueses são aqueles que estão no limiar do menor número de dias de férias pessoais (já assim tinham antes e a lei em causa nada veio alterar esse número de dias de férias pessoais).
E se a ideia é apontar os países mais desenvolvidos da Europa, porque não a instituição de um regime de férias judiciais e de férias pessoais idêntico ao da Inglaterra ou França ? Ou porque não copiar o regime da Finlândia, que muito foi elogiado pelo Senhor Primeiro Ministro ?
Aqui fica um quadro comparativo, elaborado a partir dos números do aludido estudo, para melhor compreensão:
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Conta de merceeiro

Tem sete páginas apenas, não está assinado, lança muitas dúvidas aos seus destinatários, mas existe. O estudo, com o qual o Governo justifica a redução das férias judiciais foi divulgado no ‘site’ do Ministério da Justiça e concentra agora as atenções sobre a sua sustentabilidade.
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A divulgação do documento foi suscitada pela Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, na sequência de uma queixa apresentado por um juiz do Porto. Apesar do ministério entender que o estudo não constitui um documento de natureza administrativa – “mas antes materiais relativos ao exercício da função político-legislativa do Estado – acedeu à sua divulgação.
O seu conteúdo, porém, é tido como demasiado simplista: faz um cálculo baseado em 10 meses de trabalho dos tribunais (os outros dois eram férias) e conclui por uma determinada média de processos cíveis findos por mês. Por exemplo, em 2003, a média foi de 42.407. De seguida, acrescenta mais um mês de produtividade, ou seja mais 42.407 processos, que representam 10 por cento do bolo processual.
Depois das contas, a conclusão: “É razoável admitir que a redução de um mês no período de férias judiciais de Verão poderá permitir um aumento de processos findos idêntico à média mensal de processos findos, ou seja, um aumento de 10% do número de processos cíveis findos.”
“Então isto não é mercearia?”, questiona António Martins, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, que, em declarações ao CM, coloca em causa a equações de três parcelas usada no documento datado de 21 de Abril de 2005. “Os nosso piores receios confirmaram-se. Não é uma estudo com profundidade técnica e muito menos científica.
JUIZ QUER ESTUDO CERTIFICADO
O juiz Paulo Faria espera mais do que aquilo que leu ontem no ‘site’ do Ministério da Justiça. Para já, afirma-se satisfeito porque foi dado corpo a algo que há muito era pedido, mas recorda que pediu também a certificação da autoria e da data em que estudo foi realizado.
Mais crítico, António Cluny, presidente do Sindicato dos Magistrado do Ministério Público diz ser a confirmação de que a decisão de reduzir as férias “não resultou de análise criteriosa dos problemas, mas de uma vontade política de produzir factos mediáticos”. Fala em raciocínio simplista e sugere ao Governo para usar esse mês – fora do período normal de serviço para dar formação a magistrados e funcionários.

quarta-feira, abril 12, 2006

Férias antecipadas

CRIADAS NOVAS FÉRIAS PARLAMENTARES
«A falta de quórum devido à presença em plenário de apenas 111 dos 230 deputados impediu hoje as votações semanais na Assembleia da República, que exigem a comparência de mais de metade do hemiciclo.
"Por falta de quórum não se realizam as votações", anunciou o presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, depois de ter verificado o número de deputados presentes no hemiciclo na sessão de hoje, em vésperas de fim-de-semana prolongado devido à Páscoa.
O regimento da Assembleia da República estabelece que "as deliberações do plenário são tomadas com a presença de mais de metade dos seus membros em efectividade de funções". No estatuto dos deputados é ainda referido que é "dever" dos parlamentares "participar nas votações".
Esta semana, excepcionalmente, as votações semanais deviam decorrer hoje, e não como habitualmente à quinta-feira (amanhã), em virtude da interrupção dos trabalhos parlamentares até segunda-feira, devido à Páscoa.
Em declarações aos jornalistas, o líder parlamentar do PSD lamentou a falta de quórum, afirmando que, "enquanto os sociais- democratas foram maioria [com o CDS-PP], isso nunca aconteceu". "É lamentável que o partido maioritário não assegure o quórum", acrescentou Luís Marques Guedes, referindo-se ao facto da bancada socialista ter 121 deputados, ou seja, mais cinco do que os 116 necessários para assegurar o quórum.
Em comunicado, o BE considerou que a falta de quórum foi um "episódio lamentável", que representa "um desprestígio marcante para o Parlamento". "Não há memória de tal facto desde que foi introduzido o sistema de voto electrónico, senão desde muito antes: a Assembleia da República não procedeu às votações regimentais porque não tinha quórum de deliberação", é ainda referido no comunicado».